terça-feira, 15 de maio de 2012

Portugal e nossas memórias


Fotos e texto: Luiz Gonzaga Godoi Trigo

Belmonte é a terra onde nasceu Pedro Álvares Cabral, o descobridor da Terra de Santa Cruz, no ano de 1.500, hoje chamada Brasil, o "B" do BRIC, um lugar onde 200 milhões de criaturas constroem, com muita força, farra e contradições, aquilo que pensamos ser um grande país. Se Cabral voltasse hoje à Bahia, ele jamais dali sairia para ir à Calicute, na Índia, destino oficial de sua viagem. Faria como os dois rapazes de sua frotilha que desembarcaram escondidos pela escuridão da noite e se perderam nas baladas primitivas dos alegres e safados trópicos.




Belmonte está no interior de Portugal, uns 270 km ao norte de Lisboa. É um pequeno vilarejo, limpo, bem organizado e que pode ensinar hospitalidade e turismo para qualquer país do mundo. Para mim foi uma agradável surpresa que se revelou em um final de semana (se sexta a segunda-feira) repleto de atividades e delícias. A vila é conectada com o Brasil, claro; com Israel (explico mais abaixo); com Santarém (onde Cabral, ou seus principais restos mortais estão enterrados - algumas cinzas foram trasladadas para o Panteao dos Cabrais, em Belmonte, na antiga igreja de Santiago); e com a França, sei la o por que.




Essa e a vista da vila a partir do castelo da familia Cabral. Ele era de estirpe nobre, rica e poderosa. Estudou em Coimbra, serviu ao rei em África e conquistou relevância na Corte, apesar de ser o segundo filho e não o primogênito. Daí foi escolhido para comandar a frota de treze barcos para as Índias (Calicute), mas com ordens secretas de se desviar para o poente a fim de confirmar relatos sobre a existência de terras e se seriam umas ilhas ou um continente. Bingo!!! Quis o destino e os perigos dos mares que ele perdesse sete barcos na jornada, o que deixou o rei p... da vida. Ao voltar a Portugal, com muitas especiarias das Indias, o rei aplacou um pouco a sua ira mas mesmo assim deixou Cabral 15 longos anos no ostracismo até finalmente o recompensar perto do final de sua vida.




Fiquei confortavelmente hospedado na Pousada do Convento de Belmonte, um antigo mosteiro franciscano de Nossa Senhora da Esperança (frequentado pala família de Cabral e pelo próprio), transformado em hotel de charme. A equipe era de uma simpatia e eficiência exemplares. Esse era o meu quarto, denominado Frei Humberto ...



... e essa a vista da varanda, para o vale fértil e ao fundo a famosa Serra da Estrela, ponto culminante de Portugal (1.993 m.).



Nossa Senhora da Esperança, uma bela imagem em pedra lavrada, acompanhou Cabral na viagem ao Brasil e voltou, onde esta na igreja matriz de Belmonte. Ao seu lado esta uma réplica de Nossa Senhora Aparecida, padroeira católica do Brasil.



Na fachada da igreja, uma faixa lembra que as descobertas ibéricas eram patrocinadas pelas cortes em busca de novas terras com a benção e vigilância da igreja Católica. O único problema dessa igreja é o padre, um tosco (veja abaixo).



Suas ruas e vielas guardam memórias e costumes dos velhos tempos ...



... mas seu presente é uma vibrante articulação entre essas antigas culturas e o mundo atual. O Museu dos descobrimentos, inaugurado a uns três anos, surpreende pela visão que oferece das viagens marítimas portuguesas e, principalmente, sobre sua principal ex colônia, o Brasil, com sua história, seus povos, economia e cultura (ainda bem que nem citam a política...).



Na noite de sexta feira, seguindo indicação do Sr. Vitor, do Turismo de Belmonte, fui a caria, uma aldeia vizinha, comer no restaurante Os Cangas. Rústico, simples e delicioso. Comi javali com castanhas e molho de frutas silvestres, acompanhado com meia garrafa de vinho tinto. Quanto? 14 euros.




O antigo lagar de azeite foi transformado em um museu bem arrumado e didático, com lojinha onde se degustam os azeites da região.



O Brasil está por todos os lados da vila.



O castelo dos Cabral ocupa o ponto mais alto e foi parcialmente restaurado.




Israel é importante para Belmonte porque ali foram descobertos os chamados criptojudeus. Os antigos judeus portugueses e espanhóis (assim como os mouros) foram obrigados a se converter ao cristianismo, obrigados pelo Tribunal do Santo Ofício (a malfadada Inquisição), mas alguns mantiveram sua fé e práticas de maneira discreta. As mulheres eram encarregadas de passar as tradições à sua prole, pois dominavam as cozinhas e as lides domésticas. O Museu Judaico, perto da Sinagoga, é um ponto importante de visita e pesquisa. Conversei longamente com dois casais judeus, de São Paulo, que estavam na mesma pousada e lá foram para conhecer a comunidade e o novo rabino que foi enviado para liderar a comunidade. Ouvi críticas de que o rabino é ortodoxo e isso deverá criar problemas e afastar os mais jovens da comunidade. Aliás, os católicos têm o mesmo problema, pois o novo padre é um rcaico e teve a indelicadeza de, no sábado à noite, dar uma bronca na comunidade ao final da missa e logo antes da procissão em homenagem à Virgem de Fátima. Isso depois de uma homilia sobre o amor, fiquei tão invocado com o sujeito que fui conferir sua reputação junto à parte da comunidade. É um padre grosso mesmo. Espero que os rabinos e os bispos progressistas leiam esse blog.








Sortelha é uma aldeia histórica, com antigas muralhas e as ruínas de um castelo, localizada a poucos quilometros de Belmonte. Bela, singela e instigante.






Os antigos muros cercam algumas casas remanescentes (apenas três pessoas moram no interior, mas há casas fora do "anel de pedra"). O contraste fica por conta das turbinas eólicas ao fundo.



No alto das antigas muralhas, contemplando a câmera...




Senhoras que vendem artesanato local, em Sortelha, e os homens a ver a vida e sentir o sol da tarde.



Na rodovia para Aveiro algo insólito: cegonhas fizeram ninhos nas estruturas de sinalização da rodovia.


E, finalmente, segunda feira cheguei a Aveiro para me preparar para o INVTUR. me aguardem



Um comentário:

Patricia Santos disse...

Nossa Professor,fiquei maravilhada com esa matéria, como sempre uma palta sobre Portugal gera muita curiosidade e encantamento, Belém do Pará também conserva muito algumas tradições na forma de organização, localização e comportamento de seu povo, o varal exposto a rua me fez lembrar isso.
Parabéns pela matéria
Patricia Camarão santos